24 de agosto de 2009

MHz

Desde há cinco dias que o meu viver passou a ser diferente. Vivo com a minha namorada.
Sempre disse que não gosto muito dessa palavra, namorada, parcialmente sem saber explicar o porque desse desgosto, sinto-me agora porém mais lúcido para o definir. Namorada é um adjectivo.

Quando se pergunta quem é esta pessoa? Responder é a minha namorada, como se essa fosse a totalidade do seu ser peca, eu acho que peca. Esta pessoa não existia mas agora cumpre a função de namorada e é isso que ficará a saber quem dela perguntar. Ora, se queremos ser reservados na resposta e não adiantar muito acerca da identidade da pessoa, prefiro dar o nome da dita. E resistir a demais inquisicoes.
Se ao desejo da pergunta se eleva o da resposta, pois começar pelo nome também não me parece um mau inicio.

Esclareço assim a necessidade da namorada ter mais além.

Lembro-me de ter ficado fascinado numa aula teórica de som, quando o professor apresentava as formas de propagação do som.
Sem entrar muito em tecnicalidades o som, assim como a luz, pode propagar-se em ondas curtas, longas e até ouçam só, médias.

Estas ondas, são como pessoas, as longas propagam-se de forma pouco forte (ouvimos radio, por exemplo com as restantes) através da superfície terrestre e se as pudéssemos visualizar, não veríamos uma onda, apenas um traço algo curvo, apenas uma fracção da onda em vez da total elipse da mesma.

Viver com uma pessoa é imagino, igual a uma aula de musica onde se aprende a dividir uma musica por instrumentos.

Vivo com uma mulher, com uma amiga, com uma confidente, com o outro lado do beijo. Com uma pessoa. Eu moro no seu refugio. Eu sou essa morada. (qualquer dia crio raízes nela, de tantos dias seguidos sem ir trabalhar.)

Ela tem um trabalho sério, daqueles que se estuda muito para obter e depois ainda mais para manter. Passa muito tempo fora de casa. No que eu trabalho é irrelevante, mas passo muito tempo em casa, sozinho.

Curioso como num passado recente praticamente não a via, mas estava permanentemente acompanhado. Agora vejo-a todos os dias e passo os dias sozinho, mas não só.

Das muitas coisas boas que viver com amigos nos dá, uma delas não é a oportunidade de estarmos sós com o nosso ser ou estar.

Sinto-me a redescobrir um amigo que já não via há algum tempo. Digo amigo porque nunca tive muita tendência para a auto-destruição, isso é um luxo dos ricos como a cleptomania por exemplo.

Quando vivemos com amigos, não estamos apenas, somos também um pouco deles. Quando se vive com amigos, ou outras pessoas, durante quatro anos, a individualidade esbate-se. Talvez não aconteça com todas as pessoas, mas comigo que sou do tipo romano emocional (aglutinador de impérios existenciais), sem duvida é esse o caso.

Esta mudança teve lugar há pouco tempo e assim vou descobrindo-a e todo o seu comprimento de onda, vou descobrindo-me. Somos ondas longas. Todos nós.

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