29 de maio de 2008


O Caderno Vermelho do Paul Auster foi o primeiro livro-coincidência que li. [Os livros-coincidência afectam sobretudo seres narcisistas e egocêntricos, que lêem muitos livros e julgam não ser importante equacionar que o binomio quantidade-probabilidade talvez possa ter alguma relevância na coincidência.]
Li-o num jardim interior. Sou facilmente seduzido por e quando em jardins de quatro paredes sem tecto.

Livros são psicologos, mas mais baratos. Ao leres vais imaginando o que farias em determinada situação, desde aqueles artigos na Reader's Digest do lenhador que escorregou em plena floresta perto de Milwaukee e cortou a jugular com a serra eléctrica, ou... o Matthieu do Sartre que resolveu ser valente, pegou numa espingarda e marchou para a sublimação.

Um senhor canta aqui ao meu lado e repete a palavra lifeline, É por acaso é? Seria, caso eu não fosse agora escrever sobre a ideia que me surgiu ao atravessar a ponte. [Atravessar a ponte nunca mais foi a mesma coisa desde que juntei o facto da corrente de alguns rios ser fortissima e o velho que transporta o Siddharta do Herman Hesse me ter revelado que ao ser atravessado, o rio leva-nos o que de passageiro temos. desde então, é muito devagarinho que chego ao outro lado.] A última vez que o fiz, assustou-me que sejam os livros que tenho lido que me escolhem e não o inverso.

*

Não te escreverei poemas.

Assim fechei a frase, com ponto a pé, a porta.
A tua pele não é textura e os teus olhos não são geologicamente descritiveis.
Podes tirar as conclusões que quiseres dos meus segundos sentidos, mas deixa-me tirar-te o cabelo dos olhos.
Se te comparei, tinha inscrita em mim a inexperiência do tacto.
Não és um instrumento que o com tempo se começa a apanhar meios-tons.
E que tipo de construção atroz iremos nós construir quais pilares num poema árabe?
Não, não posso dizer-te ao certo o que antes me fazia escrever poemas pluviamente, mas tu também ainda não me explicas-te o que estavam a fazer tantas esculturas tuas no V&A.

Ou

"In that world I saw a sea of sand as fluid as water; I saw stones, both large and small, that attracted one another like iron and a magnet. When they came together, they could not come apart without someone intervening, just as when one takes the iron away from the magnet without the magnet being able to hold on. But if one fails to separate them, these stones continue to stick to one another at a set distance; when they are all joined, they have the form of a ship. I myself saw a small vessel with two hulls. When a boat is thus constructed, its passengers jump into the sea, and then they embark for wherever they wish." Ibn 'Arabi
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3 comentários:

Lisa disse...

os livros nao estao me escolhendo... nao sei o quero ler... :T

Catarina disse...

«artigos na Reader's Digest do lenhador que escorregou em plena floresta perto de Milwaukee e cortou a jugular com a serra eléctrica»

lidos nos 40ºC à sombra das tardes de Agosto na Beira Baixa

Pé do André disse...

Sim, só tu para te lembrares Catarina!